Juntas no câncer de mama: como a doença mudou – para melhor – a vida de duas amigas
Postado 11 de outubro de 2019 em Universo Hope por Equipe Hope

Por Anna Carolina Lementy
O dia 1o de agosto de 2018 mudou para sempre a vida de Gisela Botelho Toledo, de 38 anos. Foi ali que a hoteleira recebeu a confirmação de que tinha um câncer de mama, suspeita que surgiu após realizar os exames ginecológicos anuais. O primeiro impacto a impediu de mexer os joelhos. Não havia firmeza. Tudo foi muito rápido. Menos de um mês depois, fazia a mastectomia total da mama esquerda. Em outubro, iniciou a quimioterapia e, em maio deste ano, a radioterapia. Hoje, faz imunoterapia e um tratamento à base de hormônios, que pode durar até dez anos. Gisela considera-se curada. Mais do que isso: uma mulher com motivos para comemorar.
Tal certeza pode até causar espanto, afinal o câncer raramente vem acompanhado de frases positivas. Mas Gisela banca essa percepção e não está sozinha. Aline Biondillo, de 41 anos, compartilha da mesma visão e da experiência. As duas são amigas há 18 anos – fizeram juntas o primeiro estágio em hotelaria. “Do diagnóstico até agora, percebo que evoluí. Penso muito mais em como conduzo a minha vida e como vivo em sociedade”, diz Gisela. “Falo que foi a melhor coisa que me aconteceu, pois o câncer se tornou uma oportunidade para refletir. Foi uma segunda chance para certas coisas”, afirma Aline.
A DESCOBERTA
Elas souberam que tinham câncer em um intervalo de dez dias. “Uma amiga em comum me telefonou para contar que estava chateada pelo câncer da Gi. Eu a ouvi e depois disse: ‘deixa eu te contar, eu também estou’. Ela quase caiu dura”. Em seguida, Aline telefonou para Gisela, e as duas gargalharam no telefone. Era tragicômico, afinal. “Desde o começo, nunca encaramos como um problema”, conta Aline. “Fomos operadas em hospitais diferentes, mas escolhemos o mesmo oncologista. Desse modo, passamos por todas as etapas juntas e ainda nos encontramos no hospital uma vez a cada três semanas para tomar medicações. As enfermeiras nos colocam sempre lado a lado”.

Para Gisela, passar pela doença não foi como imaginava. Antes, via o sofrimento nas novelas e no noticiário e pensava que pediria para morrer se estivesse na mesma situação. No entanto, ao receber o diagnóstico, guardou uma frase do médico: “é maligno, mas tem tratamento”. “Daí em diante, fiquei feliz”. Ela sofreu poucos efeitos colaterais durante o tratamento. Foi mais complicado quando precisou sair de licença. “Sou workaholic e chorei por não poder trabalhar”. Desde o início, fez questão de não ser alvo de uma preocupação excessiva dos mais próximos. Com a ajuda de seu terapeuta, escreveu uma mensagem e repassou ao seu círculo íntimo. Escreveu: “gente, eu ainda sou um ser humano normal. Mandem mensagens para contar sobre o dia de vocês, sobre o que está acontecendo no mundo”.
LIDANDO COM A DOENÇA
Para Aline, o fato de poderem se apoiar foi importante – e não só pela doença. “Os dramas eram diferentes. Gisela estava namorando há menos de um ano, e tinha medo de que a doença pudesse abalar o relacionamento recente. Já eu decidi me separar do meu então marido assim que voltei da mastectomia”. Ela acredita que o câncer trouxe a coragem para tomar decisões que vinha adiando. Era como se fosse seu marco zero. “Parece que vira uma chavinha, porque a única coisa que a gente quer é ser feliz e vamos em busca disso”.
A falta de informação clara assustava Gisela também. “Eu não sabia de verdade como era o tratamento, só que era horrível, e tinha medo de como ficaria o namoro. Ainda estávamos nos conhecendo, praticamente. Não cheguei a titubear pensando que ele não me amaria por não ter um seio, mas fiquei em dúvida quanto às dores, com receio de perder a libido, ficar com a vagina muito ressecada”, conta.

Durante o tratamento, o namorado sugeriu que morassem juntos, e ela não quis. “Era um momento meu”. Depois da radioterapia, eles passaram a dividir o mesmo lar. Uma das experiências mais desafiadoras foi a decisão quanto a congelar ou não os óvulos de Gisela para uma futura gestação, já que ela poderia se tornar estéril. Acabaram optando juntos por não realizar o procedimento e concentrar todos os esforços na cura. “Ali eu tive a certeza de que ele era a pessoa certa”.
Gisela e Aline encararam juntas a queda de cabelo, as perucas, os lenços, a cabeça descoberta, a beleza e a liberdade ao saírem carecas. Sofreram com a sensação de perder o controle sobre a própria vida e também com a dificuldade de retomar as rédeas após a cura. “É uma sensação esquisita a de se tornar uma pessoa comum de novo”, diz Aline. Hoje, ela se considera corajosa, muito por conta do apoio de amigas e amigos. “Não acho que tenho uma autoestima boa 100% do tempo, mas as pessoas são meu combustível. Se elas dizem que sou forte, linda e querida, sou”, diz. Já Gisela descobriu que quer inspirar outras mulheres. Até abriu sua conta no Instagram, onde postou sobre cada etapa do tratamento. “Não posso tirar a dor de dentro das pessoas, mas o câncer me tornou melhor, e eu gostaria que os outros pudessem enxergar isso”.